Sunday, July 10, 2011

Enterro

Lá estávamos todos reunidos. Todos de preto, com rostos de luto.
Eu estava vestindo a mesma roupa da noite anterior, quando soube que você tinha morrido.
Aquela pessoa apareceu, com seus cachos compridos. A bolsa combinava com os sapatos, a maquiagem com a ocasião, apropriada para a face de luto.
De onde é possível tirar tantas roupas e rostos de luto? É como se uma orquestra negra tivesse ensaiado secretamente durante uma vida toda para cumprir este momento com absoluta perfeição.
Desejei que ela estivesse vestida de rosa e usasse uma bolsa dourada, seus sapatos (de salto, obviamente) também seriam cor-de-rosa. Assim seria mais fácil..
Vi você pela última vez e seu corpo sendo levado para dentro da cova.
Ela continuava lá, com óculos escuros para tapar a cara de um choro sincero, mas devidamente controlado.
Desejei ter uma tesoura na minha bolsa, mas não tinha nada, nem bolsa, chaves, ou palavras. Imaginei como a puxaria pelos cabelos e cortaria um pedaço deles. Para arrancar esse pedaço dela. Como se assim, eu pudesse ter de volta uma parte do que me foi tomado.
Uma música soava de longe. Eu continuava estática, não sentia nada. Meu tempo havia parado enquanto todos passavam a cerimônia de enterro que representava qualquer outra coisa, menos a contemplação de quem você era.
Eu pensava na tesoura e nos cachos que teriam caído dentro do buraco onde estava seu corpo. Não queria que seu corpo estivesse para sempre conectado a estes fios, por isso me jogaria para cima de seu caixão e tentaria encontrar todos os fios, já misturados em pétalas de flores.
A orquestra seguia tocando sua sinfonia secreta, pessoas vinham me cumprimentar, seus olhos me diziam: "meus pêsames". Eu continuava calada. Odiava o estranhamento que aquela palavra me provocava, uma palavra inventada para aquela situação e que não me representava nada além de um sentimento de plasticidade.
Mas como essas pessoas poderiam entender o que era perder minha conexão com você? Ninguém podia.
Nem eu.